A Justiça determinou a interdição imediata de dois abrigos mantidos pela Prefeitura de Campos após constatar graves falhas na infraestrutura e nas condições de acolhimento de crianças e adolescentes. Na decisão, o juiz Márcio Roberto Costa determinou que os acolhidos sejam realocados em hotéis ou casas temporárias, destacando que os locais interditados não ofereciam condições mínimas de habitabilidade.
Segundo o magistrado, vistorias realizadas em todos os oito serviços de acolhimento do município revelaram problemas como falta de janelas, obras inacabadas, esgoto estourado próximo ao refeitório, falta de chuveiros, alimentos limitados, medicamentos vencidos e ausência de itens básicos de higiene e limpeza.
“Imagina esse frio! Tem só um vidro e a janela está quebrada. Toda a estrutura… não tem janela nenhuma, só uma cortininha. Não tem cama. Tem um esgoto ao lado do refeitório, estourado. Muita sujeira. Não tem chuveiro, não tem banho quente. Então, a gente está falando do inferno. Estamos falando de crianças de 0 a 17 anos.”, relatou o juiz sobre o abrigo Portal da Infância, um dos locais interditados.
O juiz também criticou a alimentação oferecida: “Não sou nutricionista, mas salsicha não é alimentação para ser disponibilizada de forma rotineira.”
“Está um caos. Hoje chegou a um ponto que eu perdi a paciência. Tem criança no Lar de Lara que está sem leite e sem água potável. Estão fervendo água para dar às crianças. Essas crianças estavam em situação de risco em casa ou na rua. A Fundação da Infância recebe um valor muito alto, milhões, não dá para aceitar essa situação”, continuou o magistrado.
Além da interdição, foi determinada a abertura de boletim de ocorrência na Polícia Civil.
Ação – O Ministério Público do Rio de Janeiro, por meio da promotoria da Infância e Juventude de Campos, também ajuizou ação civil pública contra o município e a Fundação Municipal da Infância e Juventude (FMIJ). A promotora Anik Assed explicou:
“É inaceitável que crianças e adolescentes, já marcados por graves violações, sejam novamente submetidos à negligência, justamente quando estão sob a guarda e responsabilidade do poder público municipal. A omissão compromete não apenas direitos básicos, mas também a confiança no sistema de proteção.”
Na ação, o MP requer que o abastecimento dos serviços de acolhimento seja regularizado em até 24 horas, sob pena de multa diária e afastamento dos gestores responsáveis. As diligências apontaram a falta de alimentos, leite para bebês, papel higiênico e produtos essenciais ao funcionamento dos abrigos. Cerca de 150 crianças e adolescentes vivem nas unidades.
Por meio de nota, a Prefeitura de Campos reafirmou seu compromisso com a política de acolhimento e atribuiu as dificuldades enfrentadas a um desequilíbrio orçamentário causado, segundo a administração, pela suspensão de repasses estaduais na área da saúde desde o final de 2024:
“A atual situação é reflexo de um desequilíbrio orçamentário provocado, dolosamente, pela suspensão dos repasses do cofinanciamento estadual na área da saúde desde o final de 2024, comprometendo significativamente as finanças municipais e exigindo readequações em diversos setores.”
Ainda conforme a nota, o orçamento destinado à FMIJ permanece proporcionalmente acima da média per capita do município, demonstrando a prioridade na política de proteção social. A Prefeitura informou que promoveu mudanças administrativas recentes e que os efeitos dessas medidas deverão ser percebidos ao longo do segundo semestre.